CAPÍTULO XVI

Existirá uma LUZ no final do túnel?

 

Onde se situarão as causas que levaram o homem de hoje e, portanto, esta civilização atual a um total desequilíbrio, não só em relação a desentendimentos e competições, mas a uma verdadeira crise em todos os aspectos da vivência humana-intelectual, moral, político, econômico, social, ecológico?

Certamente foi a perda da perspectiva do transcendente.

Os povos, através dos tempos, apesar de possuírem um conceito primitivo da Divindade, deixaram mostras de acreditar numa força imponderável que a tudo presidia. O objetivo das mais antigas tradições sempre foi o de buscar a sabedoria, a compreensão da ordem natural e a vida em harmonia com ela.

Os filósofos antigos, que começaram firmando o pensamento Ocidental, tinham uma visão muito mais global do Universo e, inclusive, consideravam a relação entre a criação e o Criador.

Platão (428‑348 A.C.), por exemplo, aceitava a existência de um Demiurgo que tinha idéias perfeitas e imutáveis e dispunha da matéria pare imprimi‑las.

Aristóteles (384‑322 A.C.) propunha que todo o movimento dentro do Universo deve ser explicado pela união da idéia a matéria.

Tomás de Aquino (1.225‑1.274) promoveu uma fusão entre o pensamento de Aristóteles e a teologia Cristã. Deus está continuamente criando o mundo através da união entre os universais, ou seja, entre as idéias abstratas, e a matéria, com a finalidade de produzir novos objetos.

Entre outros, três grandes vultos da filosofia e da ciência tiveram influência capital para que se instalasse um desligamento entre o físico e o espiritual e exerceram influência rígida pelos séculos que se seguiram.

1. Francis Bacon (1.561‑1.626) desenvolve o método empírico para o trabalho cientifico. É um procedimento indutivo com base na experimentação, partindo dos fenômenos mais objetivos em busca de uma lei geral. Para ele, o homem deveria dominar a Natureza. São palavras suas: "A Natureza é obrigada a servir o homem. O objetivo deve ser, mesmo sob tortura, extrair da terra todos os seus segredos".

A partir de Bacon, o objetivo da ciência encaminhou‑se no sentido de adquirir conhecimentos que pudessem ser usados para dominar e controlar a Natureza sem qualquer preocupação com as conseqüências ecológicas .

Além disso, o método indutivo fragmenta as partes em busca das leis que regem o fenômeno, sem preocupação com a estrutura conjunta do Universo.

2. Com Descartes (1.596‑1.649) entra para a filosofia a dicotomia entre corpo e mente, entre matéria e espírito. Ele aceitava que o conhecimento tem início pela apreensão intelectual de essências universais e de relações simples, efetuada pela intuição, elementos esses que iriam servir como fundamentos para um processo racional.

Esse processo ele descreve como tendo duas fases ‑ a da análise e a da síntese, sendo que a síntese envolve o conjunto das deduções que evoluem através da dúvida metódica e sistemática. É um método critico, dedutivo e matemático.

Ele situa o pensamento como essência da alma espiritual. Despreza o conhecimento sensível, os sentimentos e as emoções, uma vez que são estados irracionais e que não derivam de Deus. Como conseqüência, a relação entre matéria e espírito, entre corpo e alma, torna‑se metafisicamente impossível em seu racionalismo.

Deus, para Descartes, é um estado de perfeição absoluta. É concebido como Substância, a única Substância verdadeira. Esta forma de imaginar Deus, fornece premissas para o panteísmo de Spinoza (1.632‑1.677) que começa antevendo a união entre matéria e espírito.

Baruch Spinoza - Parte do conceito cartesiano de Substância Absoluta e Alma espiritual, mas une matéria e espírito, considerando-os como dois atributos da única Substância Divina. Elabora, assim, uma concepção monista, panteísta, pois tudo o que existe é um desdobramento dessa Substância que, em última análise é Deus. Esse desdobramento resulta em um número infinito de atributos infinitos tais como o pensamento e a extensão e em certo número de estados temporais e finitos, tais como os corpos humanos e todas as formas objetivas que observamos.

Considerando a matéria inerte como tendo sido inicialmente impulsionada por Deus, através de uma força que gera o movimento, Descartes desenvolve, procurando explicar o mundo, tanto orgânico quanto inorgânico, uma filosofia mecanicista ‑ o corpo é uma máquina, o animal é uma máquina, o Universo é, também, uma máquina.

Tão arraigada era esta idéia àquela época que Julien de La Mettrie (1.709 ‑ 1.751) escreve um livro intitulado "L'homme Machine" ‑ o Homem Máquina.

3. Isaac Newton (1.642‑1.727) combina o método indutivo de Bacon e o dedutivo de Descartes. Consegue, dessa maneira, formular as leis que regeriam a "máquina" do Universo proposta por Descartes. Desenvolve uma teoria matemática do mundo; cria o cálculo diferencial para descrever o movimento dos corpos dentro do sistema solar. Surge a lei da gravidade. O Universo para ele era uma máquina que funcionava de acordo com leis precisas.

Apesar de profundos estudos no campo esotérico não conseguiu estabelecer a ligação entre a matéria e o transcendente.

Afirmava ser a matéria constituída por partículas iguais em sua essência, criadas por Deus para as finalidades do mundo material. O que diferenciava os vários tipos de matéria era a forma como essas partículas se juntavam, ora de maneira mais, ora de maneira menos compacta. Essas partículas se movimentariam em conseqüência da maior ou menor atração mutua, provocada pela força de gravidade.

Seu Universo é, portanto, também, mecanicista; fora criado por um Deus externo que o governaria através de leis.

O progresso científico que ele proporcionou ao mundo daquela época, com as novas leis que vislumbrou, foi inegavelmente extraordinário, mas concorreu sobremaneira para afastar ainda mais a idéia de um Deus integrativo e favoreceu o grande surto de materialismo que surge nos séculos XVII, XVIII e XIX. Dentro desse materialismo imperante, contudo, não se pode negar que houve um grande avanço científico, sensível nas várias áreas, tanto assim que esses séculos são considerados como o período do Iluminismo.

Todavia, a concepção de um Universo e dos organismos como máquinas constituídas por peças isoladas levou à fragmentação do conhecimento, que perdura até os dias de hoje. Podemos verificar isso claramente dentro da própria pedagogia que apresenta as disciplinas completamente separadas umas das outras. O estudante, qualquer que seja sua formação, sai sem a menor noção de um conjunto sistêmico.

Como conseqüência desse reducionismo, a ciência passou a acreditar que todos os fenômenos poderiam ser entendidos uma vez que fossem reduzidos a seus componentes básicos e é nesse processo que ainda se fundamenta o método científico.

Atualmente, ressalta‑se a importância da inteligência, da parte racional, delega-se para um segundo plano o equilíbrio emocional e muito pouco se cogita sobre a dimensão espiritual. Como nosso progresso tem predominância racional e intelectual, não se prestigia e não se cultiva a intuição.

Essa tendência de considerar os fenômenos como processos mecânicos, sem preocupação com a globalidade do conjunto, e o completo abandono da participação de um Criador e da ligação existente entre Ele e a Criatura, concorreram para a estruturação de uma sociedade repleta de desequilíbrios.

Alguns pontos vigentes:

1. O sistema capitalista imperante promove péssima distribuição de renda; verdadeiras multidões vivendo na mais completa miséria, passando fome, avalanches de mendicantes, enquanto verbas astronômicas são despendidas em armamentos.

Uma economia científica deveria ocupar‑se da produção, da distribuição e do consumo daquilo que é gerado pelo trabalho do homem, proporcionando oportunidades iguais para todos. Da forma como a economia seja conduzida, depende a situação social do povo.

2. A educação não é prioridade e, no entanto, ela é, positivamente, fator essencial para o nivelamento social.

3. Inflação e desemprego, este ampliado pela aplicação de tecnologia, sem preparo paralelo à mão de obra especializada e à abertura de novos campos profissionalizantes.

4. Não se cuida mais do suprimento de artigos de primeira necessidade, mas o mercado está abarrotado de produtos supérfluos, todos manipulados pela propaganda que, na maioria dos casos, é desonesta.

5. Monopólios elevam os preços artificialmente.

6. Domínio econômico e político das multinacionais. Têm influência poderosa sobre o povo e sobre os governos. Financiam iniciativas dentro do sistema educacional e das pesquisas acadêmicas, muitas vezes buscando interesses próprios e não interesses universais. Exploram a mão de obra barata do terceiro mundo.

7. 0 homem passou a utilizar, para fins de destruição, as grandes descobertas da ciência; energia nuclear, para bomba atômica; aviões, para bombardear; grandes fábricas, para poluírem rios e meio ambiente.

8. Devastação das florestas, com diminuição da produção de oxigênio.

9. Poluição generalizada e desordenada, sem o menor controle das autoridades, não sendo novidade o quanto a camada de ozônio está comprometida permitindo a infiltração de raios solares prejudiciais à saúde.

10. Resíduos nucleares sem destino seguro para a humanidade.

11. Guerras sangrentas e intermináveis ao redor do mundo, com atrocidades inimagináveis.

12. Degradação moral. A corrupção impera entre os altos escalões dos "colarinho branco", incluindo políticos que deveriam zelar pelo bem estar da nação, e desce até os mais baixos níveis sociais, com seqüestros, assassinatos, massacres, roubos, assaltos, violências de toda a natureza, etc.....

 

Existirá uma LUZ no final desse túnel sombrio?

 

Num dos mais antigos livros, pertencente à filosofia Chinesa, o "I Ching", também conhecido como o Livro das Mutações, lemos: "Ao término de um período de decadência sobrevem o ponto de mutação. A luz poderosa que fora banida ressurge".

No século XX começou sendo desenvolvida uma noção mais orgânica do universo, particularmente como resultado das descobertas no campo das experiências atômicas e subatômicas. Elas comprovam, de forma insofismável, que existe uma coesão indissolúvel entre as partes e o Todo.

A teoria da relatividade de Einstein e a teoria quântica formulada por um grupo entre os quais Max Planck, Einstein, Niels Bohr e outros, trouxeram uma inversão dentro do pensamento Ocidental.

Essa mudança de conceitos dentro da física está levando o pensamento cientifico a ultrapassar a etapa mecanicista de Descartes e Newton, gerando uma visão mais globalizada do Universo.

Ao mesmo tempo, começa a haver uma preocupação maior para o crescimento e o desenvolvimento dos valores internos do homem.

No templo de Delfos, antiga cidade da Grécia, quando Sócrates estava em seu apogeu, lia‑se a seguinte inscrição: "Homem, conhece‑te a ti mesmo e conhecerás o Universo e os Deuses".

O homem, como foi visto em capítulos precedentes, não é só um ser físico com capacidade emocional e mental como a medicina atual ainda o considera, mas ele possui um princípio superior do qual ele provém e que permanece intacto no âmago de seu ser. Para readquirir o seu equilíbrio cósmico é necessário que ele reencontre essa partícula da Divindade que habita dentro dele.

A filosofia de Santo Agostinho expressa bem esse pensamento. Podemos sintetizar: O homem provém de Deus e a sua vida sobre a face da terra é uma peregrinação em direção a Deus.

A chave para esse reencontro é a interiorização.

Algumas linhas da Psicologia moderna estão vislumbrando esta saída e estão preconizando a Meditação como caminho para a introspeção. Entre outras, essa é uma das razões pelas quais a filosofia Oriental começa a ser prestigiada pelos grandes pensadores do Ocidente, por aqueles que perceberam que ela vem complementar aquilo que o pensamento Ocidental já alcançou em termos de conceituação do Universo. Não se trata, portanto, de uma volta ao passado, mas trata, sim, da somatória das experiências construtivas desenvolvidas pelo homem através dos tempos.

Um eficaz método de Meditação é o da Yoga de Patanjali, sábio Hindu, que o formulou há mais de seiscentos anos antes de Cristo, e que passaremos a analisar de forma sucinta. Quando penetramos a profundidade de seu contexto, percebemos claramente que ele se constitui em um método prático e científico.

A palavra Yoga é de origem Sânscrita e significa, literalmente, UNIÃO.

A sua prática tem por finalidade unir a personalidade, o aspecto consciente, à parte transcendente.

Para se obter essa união, o método apresenta vários exercícios organizados em uma seqüência conhecida como os "Oito Passos da Yoga". Ao executá-los, o indivíduo passa a adquirir uma profunda percepção de seus estados interiores.

A divisão que vamos fazer a seguir tem exclusiva finalidade didática. Todas as etapas formam um conjunto indissolúvel que deverá ser trabalhado de maneira simultânea a fim de que se alcance um perfeito equilíbrio, uma perfeita harmonia interna. As práticas da Yoga se distinguem por quatro aspectos principais:

1. Aspecto moral:

O suporte é o aspecto moral. Sem a ética poderemos procurar percorrer o caminho, mas jamais nos depararemos com o verdadeiro objetivo da Yoga. O aspecto moral tem duas abordagens: Yamas e Niyamas.

‑ A palavra Yama, dentro da mitologia Oriental, é o nome dado à Deusa que preside o mundo dos mortos, significando que o candidato à iniciação deveria provocar a morte de todos os seus aspectos negativos, de tudo quanto esteja contrário à Lei da Evolução. Os Yamas são em número de cinco:

a) Ahimsa ‑ Não fazer mal a qualquer ser vivente, nem a nós próprios, prejudicando, de alguma maneira, nossa saúde física, como por exemplo, através do uso do fumo, dos tóxicos, da má alimentação etc. Envolve também a "não violência". Ter sabedoria para reclamar direitos sem promover agressividade. Foi praticando Ahimsa que Gandhi libertou a Índia.

b) Satya ‑ Não roubar. Respeitar integralmente, rigorosamente, a propriedade alheia.

c) Asteyam ‑ Não mentir. Cuidar para não ultrapassar os limites da verdade, em hipótese alguma.

d) Brahmacharya ‑ Respeitar o sexo. Conservar a pureza de sua finalidade que é a da procriação e a da expressão do verdadeiro e sincero amor.

e) Aparigraha ‑ Não apegar‑se às coisas perecíveis do mundo, considerando‑as como finalidade da vida, mas apenas como instrumentos para se trabalhar a evolução interna.

 ‑ Niyamas são os aspectos que devem ser cultivados pelo discípulo e são, também, em número de cinco:

a) Sadhana ‑Significa Pureza que o candidato deve buscar em todos os níveis:

 

·          físico, mantendo um cuidado externo, pelo asseio e, interno, pela alimentação sadia, sem ingestão de qualquer coisa que prejudique a saúde;

·          emocional, mantendo sentimentos puros e evitando o ódio, a inveja, o ciúme, o orgulho, o amor próprio, a ambição etc.;

·          mental, mantendo pensamentos construtivos.

b) Santosa ‑ Significa Alegria. Cultivo permanente do pensamento positivo, do otimismo, até nas situações difíceis.

c) Saucham ‑ Significa Serenidade. Manter a calma e o autocontrole, sem nunca se irritar ou desanimar.

d) Svadhyaya ‑ Busca permanente da Sabedoria Universal.

e) Iswara Pranidhana ‑ Integração na Vida Universal.

 Observação: Naturalmente a amplitude destes pontos é praticamente infinita. Cada item está apresentado em tese, como tema para meditação a fim de que se possa detectar suas nuances mais sutis.

2. Aspecto físico:

Tem duas abordagens: Pranayama e Asanas.

‑ Pranayama ‑ Absorção das energias através de exercícios respiratórios, com o objetivo de dominá‑las. São elas que animam nosso corpo e que concorrem diretamente para a boa intercomunicação entre nossos componentes físico, emocional, mental e espiritual.

‑ Asanas ‑ São posturas corporais que promovem a justaposição dos centros energéticos do corpo, de maneira a direcionar o circuito das energias e só devem ser praticadas sob a supervisão de alguém que conheça a técnica e tenha capacidade de acompanhar a movimentação das energias. Essas energias acabam de ser reconhecidas pela ciência, sendo que a Acupuntura, matéria que trata deste assunto, já está implantada nas Faculdades de Medicina.

3 Aspecto mental:

Tem duas abordagens: Pratyahara e Dharana.

‑ Pratyahara ‑‑ De tal maneira serenar a matéria mental, que seja possível um desligamento dos sentidos. Não é uma fase fácil; exige treino e paciência mas, aos poucos, vai se adquirindo o domínio mental.

‑ Dharana ‑ É a fase da concentração. Adquirir a capacidade de fixar a mente em apenas um objeto.

4. Aspecto espiritual:

Tem duas abordagens: Dhyana e Samadhi.

‑ Dhyana ‑ É o estado de profunda Meditação e, nele, o praticante vê surgir em sua mente toda a riqueza de dados sobre o objeto ou o tema de meditação. É a plenitude da intuição.

‑ Samadhi ‑ É a integração no objeto da Meditação. É tornar‑se aquilo que se busca, e conhecer a universalidade das coisas. É o reencontro do transcendente.

 

A grande LUZ que o homem vem buscando através dos tempos, empregando artifícios físicos, emocionais e mentais externos, está tão próxima de nós que não a vemos. Ao passo que formos conseguindo o equilíbrio de nossa vida moral e psíquica, mais e mais iremos nos aproximando do final do túnel e, a grande LUZ, que está dentro de nós mesmos, irá se desvelando progressivamente até refulgir em todo o seu esplendor Divino.

Quando isto acontecer, teremos dado início a uma nova civilização, porque esta não depende da direção de um pequeno grupo de pessoas que ocupam cargos governamentais e que "deveriam" estar plenamente conscientes das necessidades do país, bem como ser perfeitamente responsáveis na execução dos planos de ação, mas depende da soma de indivíduos que sejam capazes de reger, com autonomia, sua própria LIBERDADE.

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